BEDUÍNOS DE IMBÉ

O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.(Martin Luther King Jr.) 

Nasci no ano de 2006 e lembro que na minha adolescência meu pai (que costumava levar a família em férias à cidade litorânea de Imbé, no estado do Rio Grande do Sul) dizia que num futuro não tão distante existiriam beduínos (nômades que vagam pelo deserto) às margens do estuário do rio Tramandaí. À época não acreditei, mesmo porque meu pai era um idealista, um fantasiador, mas agora em vejo que tinha plena razão.

 Com ações dos maus – solidificadas ao longo do estuário do rio Tramandaí – derrubam-se árvores, destruíram-se abrigos de aves, ergueram-se novas pontes e elevados edifícios numa área considerada de Prioridade Extremamente Alta para a Conservação da biodiversidade brasileira pelo Ministério do Meio Ambiente, de sorte que neste ano de 2032 não existem mais as árvores, as aves, os botos, os peixes e toda uma fauna e flora de antigamente...só restando o deserto e o concreto (decorrentes, ironicamente, de obras ditas de 'revitalização' e de nociva expansão imobiliária) dispostos ao lado de uma coleção d'água pútrida que escorre para o mar tomada de altas concentrações de coliformes fecais (juntando-se a resíduos plásticos jogados na orla ante a conivência do poder público que deveria fiscalizar), tudo decorrente da inversão de prioridades ditadas pelos 'gestores' públicos locais. As ações de alguns idealistas quando já se pronunciava a efetiva concretização do desastre ambiental foram insuficientes para evitar o pior. 

Dizia o meu pai que os políticos da época comparavam o povo à boiada, mas que erraram, sendo o comparativo uma ofensa aos bois, pois estes veem (a população não viu que árvores foram abatidas e aves já não voavam em profusão no estuário do rio Tramandaí?), escutam (a população não percebeu que escasseavam os cantos das aves?) e mugem (a esmagadora maioria da população ficou em silêncio ante o descalabro construído à sua frente; sequer mugiu!).

 Meu pai – a exemplo de Martin Luther King – preocupava-se muito (e com justa razão) com o silêncio dos bons..


(Nota do editor: este texto circula na internet. Um exercício de imaginação bem próximo da realidade, se nada mudar).

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