OS PERIGOS DAS LUZES ARTIFICIAIS

 



ATHOS STERN

Engenheiro, professor aposentado da Ufrgs

Consultor da Associação Comunitária de Imbé-Braço Morto


ALAN é a sigla para "Artificial Light at Night" ou "Luz Artificial à Noite", em português. Refere-se à luz emitida por fontes artificiais durante o período noturno, como iluminação pública (lâmpadas de rua e faróis), letreiros luminosos, iluminação residencial e comercial, além da luz gerada por dispositivos eletrônicos, incluindo celulares, computadores e televisores.

Embora indispensável para muitas atividades humanas, a ALAN tem implicações significativas para o meio ambiente e para a saúde de todos os seres vivos. O uso descontrolado e a emissão de luz com espectros inadequados, particularmente o azul, podem causar uma série de problemas, como interferências nos ritmos circadianos, prejuízos a ecossistemas noturnos e danos fisiológicos e metabólicos a humanos e outros organismos.

Pesquisas recentes revelaram impactos alarmantes da ALAN sobre organismos vivos e ecossistemas. Um exemplo notável é um estudo realizado na Áustria, que constatou uma redução significativa na atividade de superfície das minhocas expostas à luz artificial, limitando sua capacidade de forragear e reproduzir-se. Essa luz também afeta interações ecológicas, como a germinação de plantas e o crescimento acelerado de espécies invasoras.

Além disso, a ALAN desregula ritmos metabólicos de mamíferos, insetos, anfíbios e outros seres vivos, causando alterações na fisiologia, comportamento e sucesso reprodutivo. Em humanos, os impactos são amplos: desde distúrbios do sono até doenças crônicas e riscos aumentados de certos tipos de câncer.

COMO A ALAN AFETA A SAÚDE HUMANA?

Os efeitos da luz artificial à noite na saúde humana são profundos e abrangem tanto o bem-estar físico quanto o mental. Abaixo estão os principais aspectos documentados:

1. Ritmos Circadianos e Melatonina

A ALAN prejudica os ritmos circadianos, que regulam o ciclo sono-vigília e diversos processos metabólicos. A luz artificial, especialmente a luz azul, reduz a produção de melatonina, um hormônio vital para o sono, resultando em:

  • Insônia e sono de baixa qualidade.
  • Fadiga crônica e declínio da capacidade cognitiva.

2. Metabolismo e Doenças Crônicas

A desregulação dos ritmos circadianos também afeta o metabolismo, contribuindo para:

  • Obesidade: Alterações no apetite e aumento do armazenamento de gordura.
  • Diabetes tipo 2: Resistência à insulina causada pela interrupção de ciclos metabólicos.
  • Doenças cardiovasculares: Elevação da pressão arterial e inflamação crônica.

3. Riscos de Câncer

Estudos epidemiológicos associam a exposição contínua à ALAN a maior risco de câncer, particularmente de mama e próstata. A interrupção dos ciclos hormonais, juntamente com a redução de melatonina (que possui propriedades antioxidantes), aumenta a susceptibilidade ao desenvolvimento de tumores.

4. Saúde Mental

A luz artificial noturna também tem implicações graves para a saúde mental, contribuindo para:

  • Depressão e ansiedade devido ao desequilíbrio hormonal.
  • Maior incidência de transtorno afetivo sazonal (TAS), especialmente em áreas urbanas com poluição luminosa intensa.

5. Impactos em Crianças

Em crianças, a exposição à ALAN está ligada a:

  • Desenvolvimento cognitivo prejudicado.
  • Maior risco de obesidade infantil devido à má qualidade do sono e alterações metabólicas.

6. Exposição a Dispositivos Eletrônicos

Dispositivos como celulares, tablets e computadores agravam os efeitos da ALAN devido à alta emissão de luz azul. O uso desses aparelhos antes de dormir intensifica os problemas relacionados à insônia, fadiga e desregulação hormonal.

Impactos Ecossistêmicos

Os estudos sobre a ALAN também destacam consequências devastadoras em organismos vivos e ecossistemas:

1.     Minhocas: Experimentos na Áustria mostraram que minhocas expostas à luz artificial apresentaram redução de até 76% na atividade de superfície. A interação com plantas também foi afetada, reduzindo a germinação de sementes de espécies invasoras como a Ambrosia artemisiifolia (ragweed) em até 33%.

2.     Plantas Invasoras: Sob luz artificial, o crescimento em altura do ragweed aumentou em 104%, resultando em maior competição com culturas agrícolas e impacto direto na saúde humana devido ao pólen alérgico. (conhecida por causar alergias devido ao seu pólen altamente alergênico

3.     Predadores e Presas: A ALAN desregula interações críticas, como rotas de migração e ciclos reprodutivos, desestabilizando ecossistemas que dependem de ritmos naturais.

Essas descobertas enfatizam a importância de estratégias de mitigação, como o uso de luzes em espectros menos prejudiciais (âmbar ou vermelho), a redução da intensidade luminosa em áreas urbanas e rurais e a conscientização sobre os impactos da poluição luminosa.


Conclusão:

Os prefeitos do litoral norte do Rio Grande do Sul devem avaliar com extrema cautela qualquer proposta de alteração no sistema de iluminação pública. A iluminação atual, além de ser satisfatória e funcional, não gerava impactos ambientais significativos, preservando assim o equilíbrio do ecossistema local. A substituição por um modelo "moderno", sem a devida fundamentação científica ou estudos de impacto ambiental, representa não apenas um risco real ao meio ambiente, mas também uma ameaça a todas as formas de vida no município.

Permitir que fabricantes, motivados exclusivamente pelo lucro, influenciam decisões públicas dessa magnitude é uma postura irresponsável e contrária ao bem-estar coletivo. Para proteger a biodiversidade, a qualidade de vida da população e a sustentabilidade da região, é essencial que qualquer mudança seja embasada em pesquisas sólidas e alinhadas às melhores práticas ambientais. O progresso verdadeiro não pode ser alcançado à custa do meio ambiente e das gerações futuras.

 


Comentários

  1. Magnífica síntese do Professor Athos Stern sobre os riscos da ALAN.

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