EDIFÍCIO EM APP E DUPLICAÇÃO DE AVENIDA CONTESTADOS NO MP
Stern, ex-presidente e consultor da Associação Comunitária de Imbé-Braço Morto, argumenta, na petição:
" Foi autorizado e iniciado empreendimento imobiliário de 15 pavimentos em área contígua ao Rio Tramandaí, que é classificada como Área de Preservação Permanente (APP) pelo art. 4º, inciso I, do Código Florestal e pela Resolução CONAMA nº 303/2002.
2. Segundo informação oficial da Prefeitura de Imbé, trata-se de APP não consolidada, pois não havia ocupação regular anterior a 22/07/2008 (marco temporal definido no art. 61-A da Lei nº 12.651/2012). Nessas condições, qualquer edificação é vedada, sob pena de nulidade do licenciamento e responsabilização dos agentes envolvidos.
3. No mesmo contexto, a Prefeitura iniciou a duplicação da Avenida Nilza Costa Godoy, obra que ocupa área marginal ao Rio Tramandaí, igualmente em APP, sem Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), Relatório de Impacto Ambiental ou licenciamento junto ao órgão ambiental competente, afrontando os princípios da prevenção e precaução.
4. Tais empreendimentos acarretam supressão de vegetação nativa, impermeabilização do solo, interrupção da drenagem natural, aumento da suscetibilidade a enchentes e alagamentos e descaracterizaçã
o a recarga do lençol freático,
o a filtragem de sedimentos,
o a contenção de processos erosivos,
o a proteção da fauna e flora ribeirinhas,
o e a regulação microclimática urbana.
5. A ocupação indevida de APP em Imbé/RS, por sua natureza geográfica e hidrológica, aumenta significativamente os riscos de inundações, especialmente em eventos de cheias do Rio Tramandaí, fenômeno já recorrente e intensificado pelas mudanças climáticas.
II – FUNDAMENTAÇÃO TÉCNICA HIDROLÓGICA E URBANÍSTICA
- Impermeabilização do solo: a substituição de áreas permeáveis por concreto e edificações reduz a infiltração, aumenta o escoamento superficial e sobrecarrega os sistemas de drenagem, elevando o risco de alagamentos em períodos de chuvas intensas.
- Efeito cumulativo e sinérgico: a construção de grandes empreendimentos em áreas frágeis, somada à duplicação de vias marginais, cria um processo de fragmentação ambiental, dificultando a manutenção da conectividade ecológica e ampliando o risco de colapsos no sistema de drenagem urbana.
- Alteração do microclima urbano: a verticalização em áreas litorâneas e ribeirinhas provoca ilha de calor, aumento da temperatura local e piora da qualidade ambiental, impactando diretamente a saúde e bem-estar da população.
- Violação urbanística: a ocupação de APP não apenas contraria a legislação ambiental, mas também os princípios do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), que determinam a função social da propriedade e do planejamento urbano sustentável.
III – DA JURISPRUDÊNCIA
O Poder Judiciário tem reiteradamente reconhecido a nulidade de licenciamentos em APP não consolidada e determinado a remoção de construções irregulares. Exemplos:
- STJ, AgInt no REsp 1.797.175/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 17/12/2019:
“É vedada a ocupação de APP em área não consolidada, sendo inviável a regularização de construções erigidas após 22/07/2008, por afronta direta ao Código Florestal e ao princípio da prevenção ambiental.” - STJ, REsp 1.365.364/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 26/08/2013:
“A ocupação irregular de APP implica nulidade do ato administrativo de licenciamento e não gera direito adquirido à manutenção da obra.” - STF, RE 654.833/SC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 08/04/2021:
“A proteção das áreas de preservação permanente é expressão do princípio da vedação ao retrocesso ambiental, não sendo possível sua flexibilização em afronta à Constituição.” - TRF4, AC 5004834-90.2016.4.04.7205, Rel. Des. Fed. Fernando Quadros da Silva, julgado em 07/06/2018:
“A construção em APP não consolidada, mesmo que autorizada por município, é ilegal e sujeita à demolição, prevalecendo a legislação federal sobre normas municipais permissivas.”
Esses precedentes reforçam a impossibilidade de manutenção de empreendimentos em APP não consolidada, impondo a demolição e recomposição ambiental.
IV – DO DIREITO
Amparam a presente representação:
- Constituição Federal, art. 225, caput e §1º, incisos I e III;
- Código Florestal (Lei nº 12.651/2012, arts. 3º, II; 4º; 7º e 61-A);
- Resolução CONAMA nº 303/2002;
- Lei nº 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública);
- Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001, arts. 2º e 39).
V – DOS PEDIDOS
Diante do exposto, requer-se a este Ministério Público Estadual:
1. A instauração de Inquérito Civil para apuração da legalidade da construção do edifício e da duplicação da Avenida Nilza Costa Godoy em APP não consolidada, no Município de Imbé/RS;
2. A requisição de todos os documentos relativos ao licenciamento, alvarás e pareceres técnicos que embasaram as aprovações municipais;
3. A análise da nulidade dos atos administrativos que autorizaram as obras, por afronta à legislação ambiental e urbanística;
4. A responsabilização civil, administrativa e criminal dos empreendedores, técnicos e agentes públicos envolvidos;
5. A adoção de medidas liminares para embargo imediato das obras, evitando a consolidação dos danos ambientais;
6. A determinação da recomposição da APP, com demolição de construções irregulares e restauração ambiental da área degradada.
VI – DO ENCERRAMENTO
Diante da gravidade do caso, da flagrante ilegalidade e do risco de danos irreversíveis ao Rio Tramandaí e à coletividade de Imbé/RS, confio na pronta atuação deste Ministério Público Estadual, em defesa do meio ambiente e da ordem urbanística, nos termos do art. 225 da Constituição."
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