O CEMITÉRIO DE NAVIOS E O PORTO DE ARROIO DO SAL: UM ALERTA IGNORADO
Há 49 anos anos o navio cargueiro Altair encalhou junto à praia do Cassino, em Rio Grande
ATHOS STERN
Engenheiro, professor aposentado da Ufrgs
Consultor da Associação Comunitária de Imbé Braço-Morto
1. O litoral mais perigoso do Brasil
O litoral do Rio Grande do Sul é conhecido como o “Cemitério de Navios”. Essa fama não é exagero:
- A combinação de correntes marítimas fortes, bancos de areia móveis, mar aberto sem proteção natural e tempestades frequentes fez com que dezenas de embarcações naufragassem na região ao longo dos séculos.
- Torres, Tramandaí, Imbé e até a costa de Mostardas guardam relatos de encalhes e naufrágios, confirmando a instabilidade dessa faixa do Atlântico Sul.
Essa realidade histórica é um alerta natural: a costa gaúcha é hostil a operações marítimas de grande porte.
2. Lições do Porto de Rio Grande
Mesmo sendo o porto mais consolidado do Estado, com canal de acesso dragado e alguma proteção, o Porto de Rio Grande enfrenta dificuldades sérias:
- Neblina frequente → paralisa manobras de entrada e saída de navios por falta de visibilidade.
- Ressacas e ciclones extratropicais → causam fechamento temporário do canal, atrasos na atracação e risco de danos estruturais.
- Custos elevados de dragagem → o assoreamento permanente exige obras constantes, tornando a manutenção cara e complexa.
Esses fatores já reduzem a competitividade de Rio Grande em comparação a outros portos brasileiros.
3. O futuro: intensificação dos extremos
As projeções climáticas indicam que, no Atlântico Sul, eventos extremos serão mais frequentes e mais intensos:
- Ressacas mais fortes, invadindo orlas e estruturas costeiras.
- Ciclones extratropicais mais recorrentes, trazendo ventos e ondas destrutivas.
- Períodos maiores de paralisação portuária devido à insegurança operacional.
Se um porto consolidado como Rio Grande já sofre paralisações, o que esperar de Arroio do Sal, onde não há canal protegido, abrigo natural ou histórico de operações marítimas complexas?
4. O Porto de Arroio do Sal: vulnerabilidade máxima
Construir um porto em Arroio do Sal significa expor uma infraestrutura caríssima:
- Diretamente ao mar aberto, sem baía ou enseada que amorteça ondas e ventos.
- À erosão costeira, que já ameaça praias vizinhas como Curumim e Capão da Canoa.
- Aos mesmos fenômenos que paralisam Rio Grande, porém sem a mesma robustez de infraestrutura.
O resultado provável é um porto sujeito a paralisações frequentes, danos estruturais e custos permanentes de manutenção, tornando-se um passivo financeiro e ambiental.
5. Conclusão: da história ao futuro
Se o litoral gaúcho ganhou o título de Cemitério de Navios por sua periculosidade natural, insistir em instalar ali um grande porto marítimo é ignorar a lição da história e da ciência.
- O Porto de Rio Grande já dá sinais de vulnerabilidade diante de neblina, ressacas e ciclones.
- Arroio do Sal, ainda mais exposto, corre o risco de se transformar não em um polo de desenvolvimento, mas em um símbolo de erro estratégico:
- altos custos de construção e manutenção,
- paralisações constantes,
- agravamento da erosão e perda das praias,
- desvalorização do turismo e da qualidade de vida.
Trata-se, portanto, não de uma solução, mas de um desastre anunciado, que compromete o futuro do litoral e repete — em escala ampliada — a trágica história de naufrágios que batizou essa costa como o Cemitério de Navios.
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